terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Amor suburbano - Quarta parte.

A irmã entrara pela sala dizendo que tinha comprado uma calça e uma blusa no calçadão que tudo estava muito barato naquele sábado. A mãe entrou na sala reclamando que perdera muito tempo e que Marta demorou muito para escolher as roupas. Enquanto isso a irmã se defendia falando do banheiro que grande parte do tempo era a mãe que perdera escolhendo uma blusa para Helena. Neste momento Rosa passava o pacote para a filha que sorriu e beijou a mãe agradecendo a blusa branca com frente em renda, certamente esta não havia sido tão em conta, não perguntou, era um presente. Foi em direção ao quarto ao mesmo tempo em que a irmã já vestia a sua roupa, a blusa caiu perfeito no corpo, a mãe conhecia as medidas das filhas, o sábado era assim, feira, mercado e faxina e o preparo do almoço do domingo. Pela noite a amiga Ester sempre vinha buscá-la pra saírem, às vezes uma boate para dançar, uma festa de amigos ou um jantar. Não era de muito sair tinha medo da volta, as ruas desertas na zona oeste eram perigosas. Namorados já havia tido alguns, mas nada sério, quando entrou na faculdade estabelecera uma meta só depois que conseguisse sua independência financeira. A loja estava cheia na sexta-feira era final de mês, o telefone toca sem parar do outro lado do balcão Juliana funcionária mais antiga da loja e filha de Maria Tereza que durante mais de vinte anos foi à empregada dedicada na casa dos seus pais, hoje aposentada, indicava para Artur atender, pegou o telefone e era seu Manoel o porteiro e já começou se desculpando pelo incômodo dizendo que a moça veio perguntar de novo sobre o apartamento e se ele já havia decidido, Artur atendeu o telefonema, entre notas e troco salientou que a moça deixasse uma fiche de cadastro e mais tarde faria uma análise. Desligou o aparelho, sinceramente não gostaria de alugar o apartamento havia comprado para morar, o dos pais era maior ele se sentia solitário, deixaria o tempo passar, mas num futuro próximo iria conhecer a tão famosa amiga de seu Manoel. Arthur subia a serra em média duas vezes ao mês para visitar a mãe e a tia Lara, sempre encontrava os primos e primas. Todas já casadas, ele é padrinho do sobrinho mais velho que já cursava o segundo grau. Geralmente subia no sábado a tarde, gostava da noite de Petrópolis, com seus bares, um show para curtir no fim de semana ou mesmo uma música ao vivo num barzinho. A noite era fresca diferente da orla carioca que também era ótima. A Rua Tereza com seu comércio agitado até um dos primos tinha ali uma confecção, ele e a mulher estava há quase quinze anos, me lembro de que o casal de filhos vivia desde novinhos misturados a panos e retalhos dentro da confecção. Pelo menos uma vez ao mês a família se reunia na casa da tia, um encontro com feijoada ou churrasco. Um encontro animado tinha uma ponta de família italiana com um espírito de festa do carioca. Como a maioria residia na cidade do Rio de Janeiro, nossos encontros tinham um ambiente saudável sem aqueles chiliques de noras e genros emburrados e assuntos chatos, a gente só se via lá na serra. E era lá que a gente saia em grupo para se divertir juntos como nos tempos da nossa adolescência, os filhos ficavam em casa dormindo aos cuidados de minha mãe Almerinda e tia Lara. Voltávamos já de madrugada como se ainda tivéssemos vinte anos e em nossa chegada havia uma farta mesa de café e até sopa para aqueles que abusavam um pouco mais na bebida, no domingo à tarde descíamos para recomeçar na segunda mais uma semana de trabalho.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Amor Suburbano – Terceira parte



Trabalhar na zona sul é um desconforto para quem reside na zona oeste. Um trem e um ônibus, ida e volta é um cansaço em demasia, principalmente agora que dava expediente na clínica até tarde e ficou cansativo viajar todos os dias. Durante a semana quase não via irmã que chegava tarde do cursinho, visto que dormia cedo, pois tinha que acordar às seis e meia da manhã hora esta em que a irmã ainda dormia, Maitê estava com dezessete anos e dedicada nos estudos, pretendia seguir a profissão da irmã, ser terapeuta. Não queria namorar e dizia não se preocupar com isso, como a irmã, os estudos era o mais importante. Mesmo na dificuldade com a morte do pai, parte do seguro de vida proporcionou sua formação e estava garantindo parte da formação da irmã que trabalhava em um pequeno magazine no bairro, com um horário de meio expediente e um salário suficiente para garantir suas necessidades de adolescente. A mãe Rosa uma mulher de andar pesado e lento, ficou viúva com duas meninas para criar, Helena com dezesseis anos e Maitê de oito anos. O marido foi trabalhador da companhia de energia do estado, faleceu de um infarto fulminante aos quarenta e quatro anos, após um acidente de trabalho. Rosa sofreu muito, mas tinha duas meninas para criar e prepara-las para o futuro. Ficou com uma aposentadoria razoável e um seguro de vida que bem administrado custeou a faculdade de Helena a mais velha, a casa própria foi um dos feitos, do marido deixando mãe e filhas em segurança. Mas a filha mais velha insistia em pagar parte dos estudos da irmã, Rosa sabia que era uma maneira da filha pagar todo o esforço da mãe, as filhas eram tudo na sua vida, ela mãe cuidava de tudo, suas roupas, a comida que cada uma gostava e o carinho dado sempre com um beijo na saída e na chegada. Helena estava na sala vendo televisão e sobre a mesa muitos papeis, o fim de semana era também um bota fora, quando do portão veio o som de palma que fez Helena se levantar correndo e verificando pela janela a pessoa que chamava fez um sinal de espera com as mãos pegando a chave e seguindo até o portão. Seu Manoel já havia descido da bicicleta e retirando da bolsa dois potes de tempero caseiro, uma maneira de aumentar sua fonte de renda. A mulher preparava os temperos durante a semana e ele entregava no fim de semana, passou os potes às mãos de Helena e foi explicando-se que na próxima semana iria falar com o proprietário, ela disse que não tinha pressa e quando ele quisesse conversar estaria pronta. Ela se despediu e agradeceu ao homem que esteve buscando ajuda-la este subindo na sua bicicleta saiu para realizar outras entregas. Helena voltou à sala, ficou feliz pela nova possibilidade de negociar e lembrou que por duas vezes visitou a local avisada por seu Manoel quando estava com as chaves para limpeza quinzenal, durante algum tempo visitou vários locais, flats e apartamentos, mas sempre havia uma barreira, imóveis velhos, vizinhança, preço, etc... Quando conversou com seu Manoel homem que conhecia muita gente e disse-lhe que no edifício em que ele trabalhava havia um apto fechado e que o proprietário não tinha intenção de alugar, mas se ela insistisse talvez ele viesse a ceder. Ela já sonhara com o imóvel e já tinha idealizado na cabeça como utilizaria poucas mobílias no quarto teria colchão no chão sobre os tapetes, cabides pendurados e almofadas pelos cantos, somente na sala uma mobília mais formal para receber amigos, tudo seria perfeito a mãe e a irmã, poderiam vir no fim de semana, a praia estava perto e todas poderiam aproveitar. Dirigiu-se para a cozinha e preparou um café, colocou biscoitos em um prato, retornou a sala e se ajeitou no sofá, ligou a televisão correndo os canais e parou em um canal de desenho, desde criança adorava desenhos e mesmo hoje nos momentos de descanso assistia. Acordou com o ruído do portão havia dormido por quase uma hora, levantou e ao abrir a porta da sala, a mãe e a irmã chegavam da feira ajudou com as bolsas enquanto a mãe dispensava o táxi.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Amor suburbano - Segunda parte.


Dois dias depois estava no meu apartamento, não tinha ido trabalhar pela manhã, fiz uma caminhada e comprei jornais. Após folhear os jornais, olhei para o relógio que marcava doze horas, do apartamento ao restaurante seriam trinta minutos, andei de um lado para outro, acendi um cigarro e fui para a janela, mas o meu coração insistia em sair, então apaguei o cigarro e resolvi almoçar na pizzaria ao lado da loja. Eu estava impaciente a todo tempo meu pensamento estava naquele rosto, estranho, nunca havia me acontecido antes. A última vez que fiquei assim foi quando passei dois dias ao lado do meu cachorro, ele estava velho com mais de doze anos e vinha tendo problemas de respiração, comendo demais e andava ofegante com a respiração acelerada. Senti que escorria lágrimas nos seus olhos de uma dor imensa que vinha feito a pontadas, por duas vezes ele apagou e voltou repentinamente que chegou a andar alguns metros e caía e depois foi morrendo aos poucos olhando pra mim que fui massageando o peito dele. Tenho certeza que morreu feliz ao lado da pessoa pra quem ele foi o mais fiel dos amigos, ou seja, o estado de ansiedade por querer viver aquele momento. Saí da loja e no meio do caminho resolvi ir ao Leblon, havia mais de vinte dias que eu não entrava no apartamento, eu o havia comprado a mais de seis meses. A intenção era morar no bairro, mas fui adiando a mudança e já não tinha certeza que mudar seria uma boa ideia. Eu poderia tê-lo alugado e estar ganhando um bom dinheiro, o edifício era bem localizado numa rua residencial de esquina com uma avenida comercial.
Ao entrar apartamento, fui abrindo a porta que dava para a sacada para que entrasse o sol e sem mais imaginei encontrá-la sentada na sacada, e a me ver, levantaria e viria em minha direção me dando um beijo e puxando para o corredor, onde havia um pequeno quarto que ela transformara em um escritório com computador, estante e todos os livros meus e dela reunidos. O quarto principal estava decorado estilo árabe com quadros pelas paredes, fotos minhas, dela e juntos. Grandes almofadas espalhadas e colchão ao chão rodeado de espessos tapetes. Os desenhos foram feitos a mão com lápis de cera, de vários tamanhos, desenhadas em vinte minutos pelos artistas de rua, aqueles que ficam nas praças de Paris. Foi na nossa lua de mel, viagem de vinte dias divididos entre Roma, Paris e Madri. De repente me assustei com uma voz masculina que chamava por meu nome, quando me virei avistei o seu Manoel o porteiro do prédio, me pedia a chave do apartamento, para que pudesse mandar limpar. De pronto passei a chave que estava sobre a bancada do pequeno hall entre o corredor e a sala de estar, seu Manoel pegando as chaves me pediu desculpas pelo susto, eu respondi que não foi nada, então quando chegou à porta se voltou dizendo, o senhor pretende alugar o apartamento é que tem uma pessoa que trabalha aqui perto no centro e está interessada em alugar. Respondi que ainda não tinha tomado uma decisão sobre o assunto, mas se decidisse alugar ele seria a primeira pessoa, a saber, em seguida despediu-se e fechou a porta. E antes de começar a imaginar outras situações fui novamente despertado pelo bater da porta da sacada por uma rajada de vento. Voltei a verificar todo o apartamento, tudo estava em perfeito estado, fechei tudo e desci, na secretaria do prédio me despedi do Manoel e saí andando pela calçada, o vento forte anunciava uma possível chuva de verão para o fim da tarde.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Amor suburbano - Primeira parte.

Amor suburbano



A festa foi perfeita, um casamento preparado com muito carinho e meses de espera. Artur acompanhara o namoro da prima Mara desde a faculdade, Lucas era um bom rapaz e a amava mais que tudo e já estavam juntos há cinco anos, me lembro de algumas brigas entre eles, naqueles dias Lucas não dormia e nem comia até ela voltar o namoro, parecia coisa de adolescente. Enfim, o casamento aconteceu e toda a família compareceu marcando a melhor festa dos últimos anos de Petrópolis, eu estava feliz por eles e ali na serra com toda a família reunida era muito bom. Só sentia a falta de meu pai que sempre foi à alegria em pessoa, brincando, caçoando e contando piadas na hora do almoço. Passei minha infância e
adolescência alternando da escola para a loja e no fim da tarde para casa. Ainda me lembro de que meu avô me dando dinheiro e me mandando lanchar na pastelaria ao lado. Muitos dos clientes ou pessoas que entram na loja hoje foram amigos do meu avô, o qual faleceu um ano depois da morte do meu pai e o tempo parece que voou, pois já se passaram dez anos. Desde então assumi os negócios, eu filho único, foi assim meio no tranco, recém-saído da faculdade de engenharia de Arquitetura de Petrópolis, iniciei minha caminhada no comércio e por vários momentos tive dúvidas se era aquilo mesmo que eu queria ou um escritório de arquitetura na zona sul. Minha mãe foi morar na serra com minha tia Lara parte dos meus primos vivem e trabalha na serra, minha mãe diz que a qualidade de vida é melhor, o ar é mais puro e a tranquilidade dá inveja ao baixo Rio e me ligam pelo menos uma vez ao dia. Já tive várias namoradas, mas nenhuma delas me empolgou o bastante para pensar em casamento e o pior sou muito crítico por algumas vezes desisti de uma relação mesmo antes dela começar. No geral conheço bem as mulheres, tem minhas tias, primas e na loja são duas que já trabalham comigo à quase sete anos. Nunca me apaixonei perdidamente por alguém, mas acredito que nós temos uma alma gêmea escondida por aí a descobrir.
Esta semana como de costume fui almoçar no restaurante que frequento sempre, fica as uns quinze minutos da loja, uma comida boa e frequentado por pessoas que trabalham nos escritórios e clínicas da região de Botafogo. Eu estava no fim
da refeição, quando surgiram no hall três pessoas, um rapaz aparentando trinta anos e duas moças, uma morena de cabelos encaracolados de estatura pequena e a outra uma loira de pele branca vestia um jeans apertado e uma blusa branca de mangas compridas, trazia uma bolsa pequena de couro e sandálias, combinando num marrom claro. Sentaram do lado oposto a minha mesa que estava perto das janelas, onde eu poderia observar todo o movimento do estacionamento e o hall de entrada do restaurante. Havia uma distância entre nossas mesas, o rapaz ficou lado a lado com a morena de pequena estatura que ficou frente para a loira. Escolheram os pratos e sucos, conversavam alegremente, a morena era todo sorriso ao lado do rapaz e a loira falava pouco. Sem perceber, já estava naquela mesa quase uma hora, por dez minutos fiquei a observar, parecia que eu estava sozinho dentro do salão, por momentos não ouvi vozes, nem tilintar dos pratos e talheres. Eu poderia ler seus lábios e fixar nos seus olhos que olhava ao redor sem fitar num ponto fixo, ela passava os olhos por mim sem me ver e eu a deleitar dos seus olhares roubados. Decidi ir embora, pedi a conta ao Zacarias o garçom que sempre me servia, já estava passando da hora do meu almoço. Levantei e fui em direção à mesa dos três, passei olhando disfarçadamente, ela me olhou discretamente, fui demoradamente para o carro e parecia que meu corpo não queria sair daquele lugar.